terça-feira, 8 de julho de 2008

Bolívia parte VII: Sucre



Este relato da viagem à Bolívia tem-se estendido demasiado, mas hoje termino-o contando a nossa visita à cidade de Sucre, a capital judicial do país.

Sucre está a "apenas" 2800m sobre o nível do mar, o que lhe confere um clima muito mais aprazível que nos anteriores pontos de viagem: a temperatura esteve entre os 7ºC e os 27ºC, mais coisa, menos coisa, e pudemos finalmente andar de T-shirt, pelo menos algumas horas durante o dia. Senti-me feliz por não ter frio, sobretudo ao ler nas notícias que a Argentina estava debaixo de uma onda de frio polar com temperaturas negativas até em Buenos Aires. Brrrr. Depois de Uyuni, acho que fiquei com alguma aversão ao frio.

Plaza 25 de Mayo em Sucre, província de Chuquisaca, Bolívia.

Em Sucre, tal como o tempo mais ameno, também a cidade é mais cálida. No centro histórico os edifícios são quase todos brancos e estão bem cuidados. Foi lá que Simón Bolívar deu o grito da Liberdade e manifestou a vontade de independência das colónias espanholas na América Latina. Por esta razão, Sucre é conhecida como sendo o Berço da Liberdade, embora a independência da Bolívia só tenha chegado uns quantos anos mais tarde, já depois da Argentina, pelo menos.

É uma cidade muito bonita, sobretudo tendo em conta que as cidades que visitámos não são propriamente exemplos de um urbanismo bem conseguido; Sucre, em contrapartida, e apesar de algumas favelas nos seus arredores, tem uma atmosfera mais democrática e aparenta ter uma riqueza mais bem distribuída que, por exemplo, em La Paz. Se tudo isto não contribuísse para que a cidade fosse já bastante atraente, esta é também a capital boliviana do chocolate e por isso há chocolatarias em todas as esquinas. Não é chocolate suíço, mas dá para alimentar a alma (e a gula).

Na praça principal, a 25 de Mayo, está a casa da Independência, edifício onde, em 1825, foi assinada a Declaração da Independência. Tal como tantas outras casas coloniais, tem pátios, vários, todos bonitos. Aqui neste edifício está também a primeira bandeira argentina.

O nosso hotel, também localizado na praça principal, tem esta sala de refeições. E ninguém acreditaria se eu falasse sobre o pé direito do nosso quarto!

Mas esta foi a última visita desta manhã; antes disso havíamos estado no Museu da Recoleta, alojado num convento, e no Museu Têxtil ASUR. A visita ao convento foi feita em contra-relógio, dado que as horas das visitas regem-se em função do horário dos frades que ali vivem. Embora hoje as suas funções sejam a religiosa e de museu, este edifício já foi também caserna e prisão, e aqui foi assassinado um dos (muitos) presidentes bolivianos, ao segundo ou terceiro dia a exercer funções. É caso para dizer que ser presidente na Bolívia é uma profissão de risco, pois foram vários os presidenticídios na história do país (existe a palavra "regicídio", porque não há-de existir a esta também?). Os claustros deste convento não mostram quaisquer indícios desta história atribulada: têm fontes no centro e canteiros com flores bem cuidadas, lindas, coloridas e perfumadas. Naquela atmosfera silenciosa, estes jardins são edénicos.

O Cedro Milenario, à beira da horta dos frades.



As flores nos claustros do convento.

Saindo do convento dirigimo-nos ao ponto alto de Sucre: o Museu ASUR, de artes têxteis, um museu absolutamente imperdível. Mais uma vez, uma casa do estilo colonial, com pátios, onde oferecem mates de coca e água aos visitantes. Lá dentro estão as peças produzidas por duas tribos indígenas que vivem na província de Chuquisaca, da qual Sucre é a capital. A lenta agonia da tradição têxtil andina foi contrariada com um projecto de uma equipa de antropólogos, que aos poucos soube reavivar as práticas têxteis e fazer com que as mulheres voltassem a ter um papel na estrutura da tribo. Com a modernização dos anos 80, as tribos aymarás e quíchuas foram perdendo as suas características próprias e as tradições foram morrendo com as gerações mais velhas. Este grupo centrou-se em duas tribos com características distintas e hoje o museu tem uma importante mostra - com as devidas explicações - de peças produzidas por elas. São peças absolutamente magníficas, tecidas em teares especiais, por dedos que parecem dançar em cima das linhas da trama.

Deste Museu saímos de carteiras mais leves, mas felizes com a compra de um obra de cada uma das tribos. Resta saber onde vamos ter parede para as pôr, mas isso é absolutamente secundário... algum dia teremos uma casa linda e grande (não enorme, apenas grande o suficiente para pendurar estas obras que vamos juntando) onde poderemos mostrar tudo.

Pátio do Museu ASUR, com a fonte no centro.

No centro, depois da visita à Casa de la Libertad, fomos ainda ao Parque Bolívar, uma zona que antigamente era privada mas que foi doada à cidade e aberta ao público. Está mesmo em frente ao Tribunal Superior de Justiça do país e é mais um dos muitos encantos locais.

Parque Bolívar, um oásis verde numa cidade branca.

O resto do tempo passado em Sucre foi a explorar bons cafés e restaurantes (El Huerto é o lugar para o almoço de Domingo) e a vaguear pelas ruas brancas. Com o pôr do Sol vem também o frio, que nos levou a beber um copo de Glühwein no bar alemão, o Kulturcafé Berlin.

Autocarros na Bolívia: o paraíso da designer gráfica e ilustradora que vivem dentro de mim.

Foi já com a sensação de fim de férias que fomos para o aeroporto de Sucre, prestes a apanhar o voo para La Paz. Na madrugada do dia seguinte, levantámo-nos antes das galinhas e regressámos a casa, em Buenos Aires.

1 comentário:

Mariana Ramos disse...

Mais um relato interessante, bem escrito. Qualquer dia, o Expresso convida-te para a rubrica "Em viagem" (não sei o nome, inventei-o...) e farás concorrência ao Gonçalo Cadilhe...