terça-feira, 10 de junho de 2008

Bolívia parte III: Oruro e Uyuni

Depois da vista ao Lago Titicaca chegou a altura de deixar La Paz para trás e partir em direcção ao sul do país. Mantendo-nos sempre no "altiplano", fomos de autocarro até Oruro e daí de comboio para Uyuni, a terra no meio do nada.

O passageiro da frente reclinou-se tanto que pude contar-lhe os cabelos na cabeça. Só que não quis.

O comboio que parte de Oruro em direcção ao sul. Pára em Uyuni umas sete ou oito horas mais tarde e continua o seu caminho noite dentro, Bolívia fora.

A viagem de autocarro foi feita sem história: gente em pé, sentada no chão dos corredores, uma casa de banho no autocarro que não funcionava, a estrada em linha recta a cortar o deserto andino. Às vezes o autocarro parava para deixar passageiros no meio do nada. Passámos por povoações que não tinham electricidade nem água. E tudo isto a poucos quilómetros de La Paz.

Oruro é uma terra tirada de um western, com vento e pó no ar. Dizem que se desperta nos dias do Carnaval com umas festividades de fazer espantar o demo, mas no resto do ano é uma terra tranquila - e a única cidade em muitos, muitos quilómetros. A nossa paragem lá foi para reabastecer: almoçámos num restaurante onde o Paulo comeu o "melhor cordeiro da América Latina" (creio que foi isto que disse). Eu fiquei no "prato vegetariano mais bem guarnecido da América Latina", uma imensa travessa com legumes, leguminosas, tofus e seitans. Delicioso.

Daí fomos para o comboio. Instalámo-nos e preparámo-nos para uma viagem longa, sem saber exactamente quanto tempo duraria nem relógio para estimar quanto tempo teríamos pela frente. Enquanto houve luz diurna, a paisagem consistia espectáculo mais que suficiente para nos entreter. O que resta do grande lago do altiplano faz uns lagos extensos mas pouco profundos que povoam a paisagem de flamingos em cima de um espelho de água. Naqueles lagos morre o rio que drena o Lago Titicaca.



Para nossa distracção, tínhamos uma televisão e, em algum lugar desconhecido, um leitor de DVD que nos proporcionou muita distracção e entretenimento. Não necessariamente pelos filmes em si (não vimos nenhum até ao fim) mas sim pelo modo de reprodução do filme (lá está, não vimos nenhum até ao fim). Entre a loucura da dobragem em castelhano e a legenda em inglês (hmmm... e que tal ao contrário?), uma certa falta de habilidade para lidar com tanto botão fez com que o senhor operador do aparelho nos deixasse a morrer na praia, ou seja, a um capítulo de (re)ver o final do filme Shawshank redemption. Baralhou-se com os comandos, pôs para a frente, pôs para trás, repetiu um capítulo umas três vezes na primeira tentativa e, a seguir, repetiu o primeiro segundo do capítulo umas dez vezes, o que pôs todo o comboio a fazer o mesmo gesto de arrancar o cartaz da parede, com banda sonora e tudo. Desconfio que isto não deve ter muita graça para quem lê. Serve o relato para mais tarde (eu) recordar.

Chegados a Uyuni, o frio era cortante. Não sei se já disse, mas o frio era cortante. E tenho a sensação de que, por mais que repita que o frio era cortante, não vai dar para transmitir a verdadeira sensação do frio cortante. "Nossa", exclamaria a minha amiga carioca. Em Uyuni tive frio como nunca tinha tido na minha vida. As orelhas só não me caíram da cabeça porque tinha o gorro posto. E o cabelo. Esta terra está tão desprotegida pelas montanhas que o vento que ali corre (e bem) vem tão seco e tão frio que o cieiro corta quase imediatamente os lábios. Mas o pior, pior mesmo, é que não existe aquecimento. Nunca tinha visto o interior de um restaurante cheio de gente de roupa de ski e gorros na cabeça. Excepto em estâncias de ski, claro. Em Uyuni só não há neve porque não há precipitação. Durante a noite, a temperatura desce aos 10 ou 15 graus negativos. E as casas não têm aquecimento. Convenhamos: é muito frio. Durante o dia, em contrapartida, a temperatura sobe a uns confortáveis 10 a 15 graus, o que transforma aquela paisagem surrealista num mundo confortável e quase cálido.

O Salar está a alguns quilómetros da vila (vila?). Antes disso, passamos por Colchani, uma aldeia que vive da exploração do sal. Lá perto há alguns hotéis de sal. Juntamente com o de gelo da Suécia e mais uns quantos espalhados por vários continentes, perfaz o grupo de "hotéis insólitos" do mundo.

A entrada do hotel e respectiva sala de estar

A piscina e zona de spa: há massagens, solário e uns quantos confortos que não se imagina serem proporcionados num sítio feito de sal

Os quartos. Com camas de verdade!

Depois, finalmente, a entrada no Salar.

4 comentários:

Mariana Ramos disse...

Lá viajei eu outra vez até à Bolívia. Pode ser que mais ninguém aprecie (isto porque te queixas que ninguém escreve comentários), mas eu gosto muito dos teus relatos. O episódio do vídeo é hilariante. Mas tu já viste Shawshank Redemption ou não? Lembro-me bem de o ter visto em Macau, naqueles discos enormes confundíveis com vinil.
Beijinhos

Bau disse...

Bi, gosto MUITO dos teus relatos de viajante e de portena! Ler-te faz-me dar as gargalhadas britanicas mais sonoras! Super-Fa (imagina isto tudo com acentos, ok?)

Anónimo disse...

Eu gostei muito da Bolivia e ainda falta o relato de Potosí e Sucre. Princesa estamos todos à espera!!!!
O anónimo que voces conhecem

Anónimo disse...

E o salar...
Como me fui esquecer do salar!
Nota-se que as férias já desapareceram mas felizmente já temos mais umas férias marcadas.